Poesia, um santo remédio em tempos de crise

mar 17, 2016 | Leitura

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Escrevo este texto no dia 14 de março, Dia Nacional da Poesia, um dia após a grande movimentação contra o governo que ocorreu em todo o Brasil no domingo. Radicalidades à parte, estamos aqui para falar de amor e beleza, então vamos deixar de fora a lama e a deselegância dos xingamentos pessoais em faixas e cartazes. Vamos falar dessa misteriosa combinação de letras e sons que são os versos, um mistério mais insondável do que a nossa política.

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Apesar de eu sempre ter gostado de ler, a poesia é uma descoberta relativamente recente na minha vida. Na verdade, meu primeiro contato com ela foi no Ensino Médio (que no meu tempo, claro, não tinha esse nome), nas aulas obrigatórias e sem graça de literatura. O impacto realmente importante aconteceu no cursinho, com uma professora que recitava os versos de Florbela Espanca com uma emoção tão profunda que pude ter um leve vislumbre do mistério. Por que, afinal, algumas palavras juntas mexem tanto com a nossa cabeça e outras combinações parecem inexpressivas?

Não sou estudiosa nem especialista, meu conhecimento de poesia é totalmente sensorial. Mas um dos segredos é juntar coisas aparentemente tão pouco relacionadas que dão um nó na cabeça da gente. É criar metáforas, aproximando ideias estranhas para criar imagens mentais poderosas.

É exatamente o que faz o poeta sul mato-grossense Manoel de Barros. Diga se seus versos não são de dar nó no cérebro:

Ando muito completo de vazios.
Meu órgão de morrer me predomina.
Estou sem eternidades.

Há quem fique incomodado e queira explicar bem explicadinho. Não precisa… Poema é pra fazer as ideias se engalfinharem no cérebro e dali saírem outras, novinhas em folha.

Como eu ia dizendo, nunca achei que essa história de poesia servisse para mim. Sempre quis ser jornalista, trabalhar com fatos, números, notícias – falar da vida real. Eu até achava que existia uma tal de verdade, pode imaginar?

Mas um dia topei com a Regina Gulla, uma professora de sonhos, e também com a Cassia Simone e a Cristina Balieiro, minhas duas professoras de dúvidas. E aí… a casa caiu! E o que apareceu no lugar foi um castelo encantado, uma hora de areia, que logo é levado pelo mar, outra de pó de pirlimpimpim e logo depois de fogo e gelo, tudo ao mesmo tempo.

Nesse castelo, brotaram versos que eu nunca imaginei que pudessem surgir! Achava que poesia era coisa pra “artista”, pessoas dotadas de um talento superior. Mas nas noites da oficina Gato-de-Máscara, onde Regina Gulla me ensinou a desinventar verdades e virar as palavras do avesso, tinha de tudo: programador de computador, socióloga aposentada, paisagista, engenheiro civil, menina entrando no ensino médio, juíza e gente que nem tinha terminado a escola… uma mistura de histórias e pensamentos que se transformavam nos poemas mais bagunçadores de cabeça que já vi.

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Quando eu saía de lá, demorava a pegar no sono, de tão mexidos que ficavam meus pensamentos. Mas, no dia seguinte, era como se o meu cérebro tivesse passado por uma faxina completa, daquelas em que a gente joga fora tudo que é velharia, e estivesse novinho em folha para pensar os pensamentos mais exóticos e criativos e até resolver mais fácil os dilemas do dia a dia. Como diria o escritor Daniel Galera, era como se tivessem tirado meu cérebro lá de dentro e lavado com cuidado com água morninha, depois secado muito bem com uma toalha macia. Não deve ser muito bom?

Ler – e principalmente escrever – poesia não é coisa de gênio. É só uma questão de estar disposto a olhar o mundo com olhos de criança. Pensando bem, as crianças são geniais. Olha só pra isso:

Água: Transparência que se pode tomar (Tatiana Ramírez, 7 anos)

 

Céu: De onde sai o dia (Duván Arnulfo Arango, 8 anos)

 

Tempo: Coisa que passa para lembrar (Jorge Armando, 8 anos)

Essas três definições fazem parte do livro Casa das estrelas: o universo contado pelas crianças, uma coletânea de frases ouvidas pelo professor Javier Naranjo, da Colômbia, em sua prática diária. O livro foi traduzido para o português e é genial, do começo ao fim.

Então, se todos já fomos crianças, onde foi parar a nossa genialidade? Cadê o frescor da descoberta dos nossos primeiros voos pelo mundo? Ainda continuam aí dentro de você, posso garantir. Mas exigem uma dose de desgentegrandização para aparecer de novo.

E como faz? Procure uma oficina literária, um sarau, um lugar onde as pessoas sejam amigas da poesia. Deixe em casa o trabalho, as contas e, é claro, as notícias do Jornal Nacional. Leve só aquela criança que você já foi. E logo você vai perceber que tudo começa a fazer muito mais sentido. E, se não fizer, é porque realmente não tem a menor importância…

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Lizandra Almeida

Jornalista, tradutora de profissão e proprietária da Pólen Livros, que edita livros infantis e voltados a questões do universo feminino. *Lizandra é escritora e foi convidada pelo Blog Leiturinha para compartilhar sua opinião com as nossas famílias leitoras.

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