Ser pai? Como? Para quem?

Coluninha | Por Roberta Ecleide.

Não basta ser pai. Tem que participar… Fácil de dizer, mas como?

Bem, para falar do pai, é preciso voltar à mãe, para entender como tais lugares de cuidado às crianças e jovens são complementares. Da mãe, alguns nomes podem ser dados para compreender seu lugar: acolhimento, pertencimento, aconchego, primeiras coisas (passos, palavras, aprendizados).

Do pai, outras palavras se anunciam: limite, cultura, continuidade (do aprendizado dos passos, das palavras, de outros aprenderes). Um lugar não se organiza sem o outro.

Quando se diz de situações heteroparentais, tradicionalmente se localiza nas mulheres o lugar de mãe e, nos homens, o lugar de pai. Mas mesmo nestas situações, isso não é rígido.

Saiamos desta definição estanque e passemos à delimitação de pai e mãe como funções.

Da função da mãe, o acolhimento, o recolhimento para “debaixo da asa”, a vontade (muitas vezes reprimida e censurada) de colocar o filho no colo e impedir-lhe o sofrimento, as dores, os choros e a agonia de viver. Da função do pai, o limite, o posicionamento nos ombros, o lançamento do filho ao mundo, à cultura, à aventura e ao risco.

Da mãe, as condições de existir. Do pai, as possibilidades de viver em sociedade. Não importa muito se isso vem das mulheres ou dos homens, mas estas duas dimensões – do lugar da mãe e do lugar do pai – são essenciais para a vida humana.

Os pais raramente escolhem ser pais, pois sua função vem depois. Mesmo quando ele está presente, suas ações para o recém-nascido, para os ainda infans (que não falam) são muito próximas do lugar da mãe. Podemos dizer, então, que diante de bebês, todos são “mães”.

Em um tempo só depois, vemos que os limites devem ser colocados, os espaços devem ser apresentados, ousadias permitidas. O lugar do pai precisa do aval e da confiança do lugar da mãe.

Parece ser fácil ser pai. Afinal, o começo da sobrevivência já está garantido, oras! Não diria ser tão fácil, pois dar limites com leveza e delicadeza, na justa medida, não é para qualquer um. Criar intimidade a partir do recorte, das permissões e das negativas, orientar sem receio e sem medo de não ser gostado é tão complexo quanto ser mãe.

O lugar do pai tem que garantir que o filho possa ir além dos pais. Para isso, priva o filho de ficar à sombra do lugar da mãe. E, sob sua orientação, anuncia os passos que encaminham o filho ao mundo, à cultura, à vida fora de casa.

Neste sentido, o lugar do pai também é sério e exige que a sociedade dê sustentação a seu acontecimento. A cada vez que se tem dó das crianças quando os limites são colocados, está-se desconsiderando o lugar do pai que, sem o apoio do lugar da mãe e da sociedade, falha.

Se o lugar do pai falha, os filhos ficam “presos” na lógica do lugar da mãe. Ou seja, não vão à cultura, não irão fazer parte da sociedade, pois não conseguem ousar…

Um detalhe importante: ninguém faz as vezes de pai e mãe. Ora, está em um lugar. Ora em outro. Quem faz esse duplo serviço, fica obrigado a abrir mão de si mesmo. Ou seja, sai caro.

Pais e mães precisam de apoio para educar as crianças e os jovens. A sociedade, todos os outros, devem ampará-los e ajudá-los de acordo com as condições e possibilidades de seus lugares.


Roberta Ecleide de Oliveira Gomes Kelly é psicanalista, doutora em Psicologia Clínica e pós-doutora em Filosofia da Educação.

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