Coluninha | Por Lizandra Magon de Almeida.
Da primeira vez que fui ao Rio de Janeiro depois de adulta, um dos maiores objetivos da viagem era conhecer o bairro do Cosme Velho, cantinho encravado entre morros, perto dos bairros de Botafogo e Laranjeiras. É um local encantador, cheio de casas antigas e ruas de paralelepípedo. Mas, “por que essa curiosidade tão específica?”, pode perguntar o leitor.
Porque Cosme Velho é o bairro onde morava Machado de Assis, e cenário de algumas de suas obras. O autor de “Dom Casmurro” e “Memórias Póstumas de Brás Cubas” até ganhou o apelido de Bruxo do Cosme Velho, uma homenagem ao nosso grande escritor do século 19, fundador da Academia Brasileira de Letras.
Que emoção tentar encontrar traços daquele ambiente nos livros de que tanto tinha gostado! Procurar o número 18 e tentar descobrir o que via o autor de sua janela e se isso lhe dava ideias para seus livros foi uma experiência única.
Algum tempo depois, encontrei em uma Bienal do Livro o singelo “Ex-Libris”, da Editora Zohar. No livro, a autora, Anne Fadiman (mencionei-a no meu texto passado), fala sobre seu amor pelos livros em várias crônicas muito saborosas. Ela conta, por exemplo, que, quando se casou, ela e o marido, em vez de “juntar os trapos”, resolveram juntar as bibliotecas – um processo que demorou um bom tempo, especialmente para resolver que livros duplicados seriam dispensados, dependendo das lembranças e do amor de cada um por seu próprio exemplar. No caso dos mais queridos, os dois exemplares foram mantidos até que os dois tivessem realmente certeza de que o casamento ia durar…
O que mais me chamou a atenção nessa pequena obra-prima, que explicitamente se caracteriza como “uma declaração de amor aos livros”, foi justamente a crônica em que ela fala que costuma viajar para o cenário de seus livros favoritos, para relê-los no local onde a história se desenrola. Acho que essa ideia sempre me acompanhou, mas senti uma identificação imediata na hora em que descobri que alguém mais tinha essa vontade. Dali em diante, li Jorge Amado na Bahia, Gay Talese em Nova York, Julio Cortázar em Buenos Aires, Gabriel Garcia Marquez na Colômbia…
Seguir os passos do autor nos locais em que a história acontece é uma experiência incrível para quem gosta de ler e também de viajar. Claro que também vale para o cinema – e certos lugares são tão frequentes nos filmes que quando chegamos até parece um dèja vu. Quantos filmes já não mostraram a praça cheia de letreiros e telas coloridas e vibrantes de Times Square, um símbolo de Nova York? E quantas pessoas não têm vontade de ver esses lugares com os próprios olhos?
Em “Ex-Libris”, a autora se compara a um antigo político inglês dizendo que ambos são adeptos da leitura do “Você está ali”. Ela conta de uma viagem que fez com o marido para o Grand Canyon, em que cada um lia um livro em cujo cenário estavam. E chega até a experiência da filha, ainda criança, lendo seu livro infantil em um grande hotel de Nova York, cenário de seu livro favorito. Como a personagem, a menina explora cada canto descrito no livro.
Mas, para ela, a experiência nem sempre é tão real, já que o lugar pode ter mudado muito. Eu estou longe de ser tão radical – quando você viaja junto com o livro, sempre haverá o clima, as pessoas, o idioma. Não é à toa que as pessoas vão visitar a estação de trem de Londres de onde deveria sair o trem para Hogwarts, na plataforma mágica que conduz à escola de Harry Potter. Se ler já leva você a aventuras inimagináveis, viajar e ler é uma experiência ainda mais intensa.
Que tal experimentar nas suas próximas férias? E se o orçamento estiver apertado, você também pode fazer o contrário: descubra um livro escrito na sua cidade e dê a você a chance de fazer essa dupla viagem.
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Lizandra Magon de Almeida é jornalista, tradutora de profissão e proprietária da Pólen Livros, que edita livros infantis e voltados a questões do universo feminino.