O impacto do capacitismo nas interações sociais de crianças com deficiência

O impacto do capacitismo nas interações sociais de crianças com deficiência

Desde que recebi o diagnóstico da minha filha ainda durante a gravidez, embarquei em uma jornada de aprendizado e luta por inclusão.
Hoje, com dois anos de idade, ela ilumina minha vida e me mostra, todos os dias, o poder transformador da diversidade.
Recebo frequentemente perguntas de mães de crianças típicas sobre como fazer com que seus filhos não cresçam com tantas dúvidas e receios com relação às interações sociais com crianças e pessoas com deficiência, como era de costume antigamente. A primeira coisa que precisamos saber é que existe um termo cunhado para denominar o preconceito contra Pcds, e esse termo chama-se CAPACITISMO.

Como o capacitismo influencia as interações sociais?

Assim como o racismo, o capacitismo nem sempre é algo gritante e escancarado.
Muitas vezes estamos usando práticas capacitistas porque convivemos com essa cultura (ruim) desde sempre, de forma que isso nos parece muito natural.

Quem viveu os anos 80, lembra o quanto é estranho pensar hoje em pessoas fumando naturalmente num avião ou restaurante. Porém, lá atrás, antes das leis e campanhas proibindo o cigarro em lugares públicos, isso é algo corriqueiro. Foi preciso que fizéssemos uma mudança cultural profunda para que as coisas mudassem.

Com o capacitismo, é a mesma coisa, o primeiro ponto para a mudança é tomarmos consciência de algumas atitudes que julgamos normais não são acolhedoras com a diversidade. Para o artigo deste mês, destacamos aqui algumas ideias para serem desconstruídas:

É preciso ter muito cuidado

👉🏼 Premissa capacitista: uma das ideias erradas que muitos de nós temos quando o assunto é a interação de crianças típicas e atípicas é que se precisa ter muito cuidado com as crianças com deficiência.
👉🏼 Porque essa ideia é capacitista: esse pensamento reforça que há algo que torna aquela criança diferente dos demais e que ela precisa ser extremamente protegida e isolada. Essa ideia traz consigo o pensamento de que aquela criança ou adulto é intocável, e que não há meios de incluí-la na brincadeira.
👉🏼 O que pode ser feito: procure se informar se há alguma implicação de saúde que pode prejudicar a criança naquela determinada brincadeira e procure instruir as outras crianças sobre as precauções a serem tomadas. Convoque as crianças a pensar em maneiras alternativas de fazer com que aquela criança possa participar ativamente da brincadeira.

Coitada desta criança

👉🏼 Premissa capacitista: incentivar a criança a “ter pena” ou “dó” da criança com deficiência ( o que muitas vezes vem acompanhado de um reforço religioso de agradecimento pela sua “perfeição”.
👉🏼 Porque essa ideia é capacitista: quando uma criança típica é ensinada a “ajudar” ou “ter pena” da criança com deficiência, em vez de ser incentivada a brincar e se conectar como iguais, ela absorve a ideia de que existe uma hierarquia entre elas. Isso pode limitar não apenas a formação de amizades genuínas, mas também perpetuar estereótipos.
👉🏼 O que pode ser feito: procure mostrar que cada pessoa é única e todas elas tem qualidades e características próprias. Mostrar a importância da inclusão para um mundo mais rico e plural é essencial para acabarmos com o capacitismo.

Produtos como a Barbie cadeirante é para crianças que usam cadeira de rodas

👉🏼 Premissa capacitista: não faz sentido comprar um livro, brinquedo ou apresentar um programa infantil cujo personagem principal tem uma deficiência, é uma coisa desnecessária e desagradável.
👉🏼 Porque essa ideia é capacitista: o primeiro problema nesta questão está na ausência de representatividade. A falta dessa visibilidade ensina, desde cedo, que essas crianças não têm um lugar central no mundo, tornando a inclusão um esforço isolado e não uma prática natural. Crianças que brincam com brinquedos cujas personagens têm deficiência e tem acesso à literatura infantil que promove a inclusão naturalmente se tornam mais propensos a serem adultos inclusivos.
👉🏼 O que pode ser feito: procure oferecer livros e brinquedos que abordam as múltiplas deficiências para mostrar à criança a riqueza do mundo e da natureza. Mostre que é possível fazer muitas brincadeiras e aventuras, ainda que com algumas limitações. Afinal de contas, ninguém é extraordinário em tudo que faz, não é mesmo?!

Desconstruindo o capacitismo

Como pais, educadores e rede de apoio de crianças típicas, você tem um papel crucial na desconstrução do capacitismo. Aqui estão algumas maneiras de começar:

Conversem abertamente sobre diversidade
Explique às suas crianças que algumas pessoas fazem as coisas de maneiras diferentes, mas que isso não as torna menos capazes ou menos dignas de amizade. Use uma linguagem acessível e positiva, focando no respeito e na valorização das diferenças.

Modelem o comportamento inclusivo
Crianças aprendem mais com o exemplo do que com palavras. Mostrem que incluir é natural — participem de eventos inclusivos, leiam livros que retratem personagens com deficiência, e demonstrem respeito ao interagir com pessoas com deficiência no dia a dia.
Estimulem interações espontâneas: Incentive seus filhos a brincar e conversar com crianças com deficiência. Explique que elas têm os mesmos desejos e necessidades de amizade, diversão e aprendizado.

Corrijam comportamentos capacitistas
Se perceberem expressões de estranhamento ou comentários excludentes, transformem isso em uma oportunidade de aprendizado. Não repreendam, mas expliquem por que essas atitudes podem ferir.

Desafiem o sistema
Questionem práticas excludentes em escolas, clubes e eventos. Sua voz pode ajudar a abrir caminhos para uma inclusão verdadeira.

O capacitismo não é uma barreira intransponível. Com pequenos passos e conversas contínuas, podemos ensinar nossas crianças que as diferenças não afastam, mas enriquecem as relações. Assim, construiremos um mundo onde todas as crianças, sejam elas típicas ou com deficiência, terão o espaço que merecem para florescer juntas. 💜

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O que as famílias de crianças atípicas não aguentam mais ouvir
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