Como mãe, pai ou tutor(a) de crianças leitoras, é muito provável que você se interesse em estimular suas crianças a conviverem com as diferenças e promover uma educação inclusiva, afinal de contas, a diversidade está batendo a nossa porta todos os dias.
Diferentemente dos anos 70 e 80, quando as pessoas com deficiência ficavam confinadas em suas casas e a convivência era quase que exclusiva com um diminuto círculo de pessoas próximas, hoje estamos experimentando a sensação de que há mais pessoas com deficiência no mundo do que em outras épocas. Mas é só uma impressão, pois estas pessoas sempre estiveram aí, só que trancafiadas dentro de casa.
É importante lembrarmos sempre que esta impressão errônea é motivada pelo crescente número de pessoas que tem ido à luta em defesa dos direitos desses cidadãos, e dos muitos esforços para podermos permitir a sua convivência social com maior autonomia. Os pais e mães de pessoas atípicas de hoje estão interessados em fazer valer a lei brasileira de inclusão – e estas crianças e adolescentes estão nas escolas. Seu filho(a) vai conviver com esse universo “diferente” cada vez mais.
Os atípicos estão nas redes sociais, nos filmes, nas propagandas. Mas… como podemos “fingir costume”, quando fomos educados por uma geração que não teve essa experiência?
Com quantas pessoas com deficiência você, adulto, frequentou durante seus dias de escola? Provavelmente, caso você tenha alguma pessoa com deficiência na família, foi fortemente desencorajado a fazer perguntas sobre a condição daquela pessoa. Os pais e mães de outros tempos morriam de vergonha de que o filho desse uma “bola fora”. Limitar a espontaneidade do seu filho não é um bom caminho para ajudá-lo a conviver com as diferenças.
Por isso, neste artigo vou te dar algumas dicas de como promover a inclusão dentro de casa, acompanhe até o final!
Dicas para estimular crianças a conviverem com as diferenças
➡️ Assista a filmes
O cinema é um ótimo lugar para falarmos da diversidade.
Existem diversos filmes disponíveis nos canais de streaming cujos personagens têm deficiências das mais variadas. E esses conteúdos podem atingir todos os públicos. Até mesmo a franquia X-men tem o personagem Professor Xavier, que é cadeirante (nem mesmo os super-heróis escapam das deficiências, não é?!).
Após assistir, converse com a criança sobre o que ela achou, e o que mais chamou a atenção dela. Caso ela não mencione a deficiência da personagem, pergunte para ela se ela percebeu que a personagem tem uma deficiência. Pergunte para a criança se ela sabe o que é uma deficiência e procure esclarecer que esta é apenas uma das características daquela pessoa. A medida em que a criança vai ficando interessada, você pode falar mais sobre o assunto ou vocês podem até pesquisar juntos na internet. Não tenha medo de perguntas difíceis; seja honesto com a criança: você não sabe de tudo. Mostre a ela a sua curiosidade e façam uma pesquisa juntos. Isso pode aproximar você dos pequenos.
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➡️ Contextualize com empatia
Outro ponto importante, é falar com a criança sobre a educação e o momento histórico da geração dela. É preciso mostrar que faz pouco tempo que as calçadas são rebaixadas, que os ônibus são adaptados, que existe a fila preferencial. Essas mudanças (que não são suficientes para promover a inclusão) foram importantes para que as pessoas pudessem sair de casa – mas não são o bastante. Deixe claro que é um dever de todos da sociedade acolher as pessoas com deficiência, e fazê-las se sentirem pertencentes.
Ajude a criança a compreender que a pessoa com deficiência intelectual, por exemplo, tem o tempo dela e que temos um lugar de privilégio, por ter um mundo completamente adaptado a nós. Podemos fazê-los pensar que nem precisamos ter deficiências para nos sentirmos desajustados: se você é uma pessoa que tem em torno de 2m de altura, comprar uma cama ou viajar de avião pode ser muito desafiador. Isso não quer dizer que seja impossível.
Da mesma forma, as pessoas com deficiência enfrentam desafios diários, dos mais variados. O que impossibilita pessoas com deficiência (PCDs) a realização de algumas tarefas é o despreparo da sociedade, dos aparelhos públicos e da nossa infraestrutura. No momento em que pudermos ser verdadeiramente inclusivos no campo social, as diferenças desaparecem.
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➡️Evite termos politicamente incorretos
Talvez já estejamos muito bem acostumados com algumas expressões que, para nós, não trazem problema algum. Muitas delas, nem sabemos a origem e o real significado.
Sejamos sinceros: estamos acostumados a usar de deficiências como termos pejorativos para agredir o outro. Porém, não há como negar que para um grupo de pessoas, estas expressões causam um tremendo desconforto. Afinal de contas, se você fosse uma pessoa amputada, não ia gostar de ouvir alguém falando que “desculpa de aleijado é muleta” não é mesmo?!
Sabendo disso, qual a finalidade de continuarmos usando tais expressões?! A verdade é que temos preguiça de fazer o movimento contrário, porque isso requer energia. Em se tratando da educação dos filhos, é fundamental que façamos esse esforço no sentido de adaptar a nossa linguagem aos novos tempos. E não vale se usar da expressão de que “na minha época” ou “todo mundo sobreviveu”, porque nossas crianças não viverão na “nossa época” e sim na época deles, onde o mundo e os costumes são outros. Lembra das aulas de biologia, onde o mais bem-adaptado é quem sobrevive? Então. 😉
➡️Seja anti-capacitista
Para ter uma conversa franca, é importante que você saiba primeiramente que capacitismo é todo e qualquer preconceito com pessoas com deficiência. Enquanto sociedade, não fomos ensinados a compreender que existem deficiências visíveis e invisíveis. E quando falamos em deficiências invisíveis, não estamos falando apenas numa surdez ou uma perna amputada escondida por uma calça.
Deficiências invisíveis são as que cada um de nós, pessoas normatizadas, temos. Os ditos “normais” também têm suas dificuldades e limitações de várias ordens. Tudo que eu não sei fazer e não consigo aprender, é uma deficiência minha. Mas por esta deficiência não ser escancarada, ninguém presume que sou incompetente para fazer tal coisa até que eu diga (ou se constate de fato).
Já com as pessoas com deficiência, muitas vezes acontece o inverso. Nós julgamos que eles são incompetentes em fazer alguma coisa sem antes saber se realmente são. Questionar a competência de uma pessoa ou presumir a incompetência dela, antes de averiguar de fato a sua capacidade, é capacitismo.
E tudo bem se você não sabia disso, o importante é trazer para a criança o quão errado é este comportamento, para que ela possa perceber a complexidade de cada indivíduo. Alguns conseguem fazer algumas coisas, outros não. E tá tudo bem. Entender a diversidade pode inclusive ajudar a criança a lidar com as próprias expectativas sobre a vida e seus ideais de perfeição. Durante o processo de estimular as crianças a conviverem com as diferenças, procure deixar sempre claro que ninguém, absolutamente ninguém neste mundo é perfeito.
➡️Seja gentil e autêntico
Hoje, com o vasto conhecimento disponível na internet, felizmente não estamos reféns da própria pessoa para entender e conhecer mais. Porém, perguntar não é pecado. O segredo é perguntar com educação. Pessoas com deficiência ainda se sentem, de uma maneira ou de outra, afastadas da sociedade. Por isso, a curiosidade não pode ser vista como algo ruim, uma vez que ela escancara um interesse genuíno pela outra pessoa. Muitas pessoas com deficiência estão dispostas a falar sobre a sua condição e esclarecer fatos para que as pessoas possam entender melhor sobre eles e sua vida. O conhecimento aproxima as pessoas. Por isso, precisamos orientar as crianças sobre como fazer perguntas gentis. “Porque seu pé é feio?” – é uma frase ofensiva que expressa um juízo de valor (a opinião pessoal em relação à aparência do seu pé). Já perguntar: “porque seu pé é assim?” é uma pergunta perfeitamente genuína. Permita que a criança se expresse.
➡️Faça comentários positivos
Falar sobre características positivas da pessoa com deficiência ajuda a ampliar o entendimento de que aquela pessoa tem valor, para além das suas características atípicas. Ao ver uma pessoa atípica na televisão, por exemplo, ao invés de falar “nossa, fulano nunca mais se recuperou disso, não”, ou “coitado de cicrano…” procure sair do lugar comum: “fulano está com um cabelo muito bonito”, “olha como ele canta bem” – são observações que ajudam a tirar o olhar do diferente e aproximar do padrão.
➡️Elogie o caráter, e não características físicas
Por fim, (e essa é a parte mais difícil para os pais) evite ficar elogiando somente as características físicas da sua criança e elogie atitudes e caráter. Quando uma criança entende que o seu valor está para além da sua aparência, ela começa a entender que o que importa no mundo não está necessariamente ligado a uma norma vigente, e sim aos comportamentos.
Estimular crianças a conviverem com as diferenças não é fácil e não será muito rapidamente, afinal, de nada adianta falarmos sobre a inclusão se não vivermos ela na prática.
Por isso, nunca perca a oportunidade de conversar, de convidar para uma festa ou de interagir com alguém com deficiência. Nossos filhos olham muito nosso exemplo e não se sentirão encorajados a ter amizades com pessoas diversas se não tiverem esse exemplo dentro de casa.
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