Chega uma altura da vida em que o maior aprendizado que podemos ter é o de saber voltar atrás. Você nunca me ouvirá defender a covardia ou o excesso de cautela, mas saber reconhecer o erro e pedir desculpas é um aprendizado diário – e muitas pessoas, mesmo avançadas em idade, ainda têm muita dificuldade de fazer isso.
Coluninha | Por Lizandra Magon de Almeida.
Em outra coluna, já comentei como Dona Benta se desculpa com a Emília, a reformadora da natureza, depois de dar-lhe uma tremenda bronca ao ver a bagunça que a boneca tinha aprontado no sítio, colocando, por exemplo, o rabo da Vaca Mocha no meio de suas costas, pra melhor afastar as moscas. Pode parecer uma bobagem, mas para um livro escrito há tanto tempo, é quase uma ousadia.
Digo isso, como sempre, a partir da minha própria experiência – uma lição especialmente útil nos tempos em que, como diz a música de Roberto Carlos, parece que “todos estão surdos”.
Então, senta que lá vem a história. Quando minha irmã, cinco anos mais nova, e eu estávamos na adolescência, levamos uma bronca que não caiu bem. Normalmente, meus pais sempre concordavam entre eles e fechavam posição. Então, a bronca foi unânime. Mas minha irmã e eu dessa vez ficamos chateadas: o esbregue tinha sido excessivo e injusto (olha, se você me perguntar o que foi, não lembro mais – com certeza não era nada tão grave).
Diálogo e autoridade
Nós duas confabulamos e decidimos conversar com os nossos pais. Sempre houve diálogo em casa, mas a hierarquia também era bem estabelecida. No auge da adolescência, porém, os questionamentos saem sem muito filtro, às vezes até de forma cruel. Mas dessa vez respiramos fundo, conversamos entre nós e propusemos um papo.
Por ser a mais velha, fui a porta-voz. Disse que não era porque eles eram nossos pais que, quando errassem, não deveriam nos pedir desculpas. Afinal, era isso o que nos ensinavam quando tratávamos alguém com injustiça. Por um instante, ficaram sem fala. Mas, um segundo depois, concordaram. Minha mãe chegou a comentar: “Puxa, para a nossa criação sempre foi tão claro que os pais sempre estavam certos. Nunca pensamos em questionar”.
Reconhecendo os próprios erros
Os tempos, felizmente (acredito eu), mudaram para melhor. Não se trata de perder o respeito ou a educação, mas de saber reconhecer os próprios erros. Mesmo não tendo filhos hoje, sempre me lembro desse episódio como um momento marcante da minha vida. Foi realmente um divisor de águas na nossa relação, algo que sempre me faz pensar: “Onde estou falhando? Em que posso melhorar?”.
Esse tipo de reflexão precisa ser constante em nossa vida – em todos os pequenos detalhes, especialmente em relação às pessoas que amamos. Todos podem errar – e todos vamos errar, mesmo tentando acertar. Mas saber reconhecer o erro e pedir desculpas é uma das lições mais importantes que um filho pode receber.
No caso da minha família, descobrir que meus pais também eram falíveis – mas que tinham a grandeza de pedir desculpas, o que se tornou frequente e comum em nossa família – só nos aproximou ainda mais.
Depois desse dia, em várias outras situações, deixamos de lado o orgulho e buscamos os olhos uns dos outros para dizer: “Você me desculpa? Pensei bem e sei que errei”. Em tempos de intolerância e radicalizações, autocrítica e perdão são um bálsamo.