Em uma família, valores, crenças e hábitos, geralmente, são ensinados de pais para filhos, perpassando gerações. Em relação à educação alimentar, não seria diferente. Mães e pais que seguem alguma dieta ou ideologia específica, como o vegetarianismo e veganismo, tendem a educar seus filhos de acordo com esse estilo de vida. Nós conversamos com mamães que adotam hábitos alimentares sem consumo de carne ou alimentos de origem animal na educação de seus filhos. Elas compartilharam com a gente suas experiências, informações, dicas e receitas, defendendo que é possível criar pequenos vegetarianos e veganos saudáveis e felizes!
Conheça um pouco da rotina de mamães veganas e vegetarianas
Gerusa Matos mora em Curitiba (PR), é vegetariana há 23 anos e há algum tempo que vem abolindo, também, demais alimentos de origem animal, como lácteos e ovos, mantendo ainda o queijo, que consome raramente. Quando a pequena Nicole nasceu, Gerusa tomou uma decisão: a filha seria criada de acordo com o veganismo, sem consumir qualquer alimento de origem animal. E assim foi. Hoje, com 1 ano e 3 meses, Nicole é uma menina saudável que se alimenta super bem. Para Gerusa, as maiores dificuldades que enfrenta é comer fora de casa e manter a pequena longe dos doces e industrializados, que também não estão de acordo com a educação alimentar que ela proporciona para a filha. Gerusa nunca sofreu qualquer resistência por parte da família em relação à criação da sua pequena vegana, inclusive a festa de aniversário de 1 ano de Nicole foi 100% vegana e um sucesso entre amigos e familiares! Mas a mãe confessa que fica um pouco insegura ao pensar em como conversar com a filha quando ela ficar maiorzinha e questionar seus hábitos alimentares, “pretendo que seja o mais natural possível, do tipo: nós não comemos o porquinho porque ele é nosso amigo…algo assim”, afirma.
Em relação aos aspectos financeiros e até mesmo do dia a dia da casa, Gerusa diz que não sente qualquer dificuldade. O tempo de preparo de uma refeição com ou sem carne é o mesmo e as compras no mercado ficam até mais em conta, “acabamos comendo o mesmo que uma família que come carne, só que sem a carne, então é mais barato” relata. Para ela, informação é o mais importante, “é preciso estar segura para não se deixar abater por pitacos e comentários. Quando a gente está segura de que está fazendo o certo e o melhor para nossos filhos, nada nos abala”. Segundo ela, os grupos online de mães veganas e vegetarianas também são ótimos apoios para quem segue ou pretende seguir essa ideologia. Lá, mulheres trocam experiências, compartilham informações e se ajudam mutuamente, com o intuito de criar crianças com uma alimentação mais sensível e saudável.
Beatriz Albuquerque também integra esse time de mamães. Ela, que mora em Sintra, Portugal, é celíaca (intolerância à glúten) e há 5 anos tornou-se vegetariana. Após essa decisão, Beatriz passou por duas gestações vegetarianas e, hoje, cria as filhas Helena, de 2 anos, e Júlia, de 8 meses, com uma dieta ovovegetariana. Isso significa que suas pequenas nunca ingeriram nenhum tipo de carne ou derivados de leite de vaca, mas por orientação pediátrica, comem ovos, no entanto, apenas de procedência conhecida: o quintal dos avós. A mamãe vegetariana afirma que nunca encontrou nenhuma dificuldade, até porque as meninas ainda não vão à creche. Como ela trabalha em casa, consegue preparar as refeições diariamente, preferindo alimentos frescos e naturais, “sempre vale apostar no arroz com feijão. Eu cozinho o feijão com abóbora e cenoura que é para sempre estar reforçado. A abóbora se desfaz no caldo e a cenoura eu bato com o feijão e incorporo ao caldo também. Sempre faço sopa com o máximo de legumes que eu tiver em casa. Tudo sempre fresquinho!”, conta. Para as mamães ou futuras mamães que pretendem criar os filhos longe dos alimentos de origem animal, Beatriz dá um recado: “sigam em frente e procurem orientação pediátrica ou de nutricionista especializado para que oriente uma alimentação balanceada e alguma vitamina se precisar. É possível criarmos nossos filhos dentro dos nossos valores éticos, mas tendo sempre ciência de que são seres em crescimento e precisam de uma boa base alimentar!”.
Marina de Alencar Capelini mora em Recife, é médica dermatologista, e está se especializando em Alimentação Vegetariana e Nutrição Funcional (no final deste post ela dá informações e dicas para quem deseja eliminar os alimentos de origem animal da dieta dos filhos). Marina nos contou que é ovolactovegetariana (consome ovos e lácteos) desde os 15 anos e há 5 anos, quando ficou grávida pela primeira vez, decidiu cortar de vez os alimentos de origem animal da sua vida, tornando-se vegana. Hoje, ela é mãe de Laura, de 4 anos, e de Rafael, de 1, e busca criá-los dentro dessa ideologia. A pequena Laura teve uma introdução alimentar vegana, mas por influência familiar passou a comer alguns derivados durante um tempo. Um ano depois, voltou para a dieta restrita, sem qualquer derivado. Já o pequeno Rafael nunca chegou a consumir qualquer alimento de origem animal. Marina conta que seu pai é vegetariano e seu marido tornou-se vegano, portanto a aceitação entre eles não é um problema. No entanto, familiares mais distantes costumam criticar e questionar a escolha da família. Para a mamãe, o maior desafio é a socialização das crianças, “frequentar ambientes onde não há opções veganas, visitar amiguinhos, ir à festinhas. Além disso, como veganismo ultrapassa a questão alimentar, muitas vezes é complicado encontrar produtos de higiene para crianças veganas”.
Outro desafio é conversar com os filhos sobre o assunto. O caçula ainda é muito novinho para entender que sua alimentação se diferencia dos outros, mas a pequena Laura não só entende, como colabora e “milita” pela causa, “na cabeça dela é inadmissível que alguém saiba a origem da carne e continue consumindo mesmo assim. Semana passada me pediu pra mandar ‘um áudio’ para a mãe da melhor amiga pra explicar a ela que não pode comer os animais. É bem difícil lidar. Não sei como será daqui pra frente, estamos tentando explicar a ela que a consciência sobre o veganismo desperta em um momento diferente para cada pessoa e que precisamos respeitar. É um ótimo gancho para conversar sobre diferenças e tolerância.”, conta. Para mães e pais que estejam pensando em seguir este caminho, Marina dá um conselho:
Detenha conhecimento sobre nutrição, mesmo que você não seja da área. Com isso você terá como argumentar com profissionais, familiares e curiosos. Todo vegano precisa, gostando ou não, ser ativista, no sentido de que mais cedo ou mais tarde será confrontado por pessoas que julgarão sua escolha, e nesse momento vai precisar provar que sua decisão tem fundamento e respaldo. Quando envolvemos terceiros no nosso estilo de vida, que não tem, pelo menos enquanto pequeninos, autonomia para escolher, precisamos ter muita responsabilidade. Para mim, ter filhos saudáveis é muito importante para respaldar minhas escolhas e prova de que crianças podem ser vegetarianas sem qualquer ônus à saúde.
Menos comida “de pacote”, mais comida feita em casa
Independente dos hábitos alimentares da família ou os motivos que levaram a adotar determinada dieta, é importante que mães e pais estejam cientes de que a saúde do filho deve estar em primeiro lugar. Por isso, ao escolher criar seu filho dentro do vegetarianismo ou veganismo, busque acompanhamento profissional e especializado. Para a médica Marina de Alencar Capelini, as maiores dificuldades ainda são o desconhecimento e preconceito que cerceiam o tema, “os profissionais da área da saúde em geral ainda são muito despreparados para lidar com crianças vegetarianas e, muitas vezes, desestimulam as mães a seguir a dieta vegetariana/vegana dizendo que esta causará danos aos filhos.”. Por esse motivo, informação é muito importante. É preciso entender que tanto a dieta vegetariana/vegana, quanto a alimentação com carne admitem uma enorme gama de possibilidades, desde uma alimentação saudável e balanceada até o consumo desenfreado de industrializados, ultraprocessados, açúcar e gordura. É aí que entra o papel do profissional que vai orientar o consumo de alimentos frescos, sazonais, locais, diversificados e, se possível, orgânicos e integrais.
Marina ressalta que “crianças vegetarianas precisam consumir leguminosas variadas (feijões, lentilha, ervilha, grão de bico, soja, tofu) diariamente para suprir as necessidades protéicas. Além disso é necessário suplementar a vitamina B12 e, dependendo da idade e status nutricional, também vitamina D, ferro e ômega 3”. Outro ponto importante é saber o que evitar. Assim como para crianças onívoras (que consomem alimentos de origem animal), os pais devem evitar ou minimizar o consumo de farinhas processadas, açúcar, conservantes e corantes, “menos comida ‘de pacote’, mais comida feita em casa” alerta a médica. Além disso, é preciso muito cuidado e atenção para oferecer refeições balanceadas e, se possível, manter a amamentação por 2 anos ou mais. A realidade, de acordo com a médica dermatologista, é que é sim possível criar as crianças dentro de uma ideologia e dieta restrita, desde que os pais façam isso com informação, responsabilidade, atenção e cuidado, os pequenos veganos e vegetarianos crescerão fortes, saudáveis e felizes!
Receitinhas para a criançada
Pedimos que as mamães compartilhassem com a gente algumas receitas que fazem sucesso em casa com os pequenos. Confira 5 receitinhas vegetarianas deliciosas para crianças.