São dez meses para ser mais exata. Geralmente 280 dias ou 40 semanas. Nos últimos instantes a ansiedade toma conta e é difícil racionalizar a espera. Existe uma linha tênue que separa a felicidade do medo, a vontade de conhecer das inseguranças prematuras. Os estigmas ouvidos durante toda a gravidez vêm à tona, transformados em uma única certeza: não vai ser fácil.
Do medo à ansiedade: Os sentimentos nas últimas semanas da gestação
O choro fácil se justifica pela separação que se aproxima, pelos hormônios em excesso, pela mudança repentina. Se uma palavra pudesse descrever o pré-parto seria urgência, ou algum sinônimo de pressa. Eu, por confusão dos astros, apesar de virginiana, tenho como característica a desorganização, ouvia sobre a necessidade de “arrumar o ninho” e achava balela. Agora pareço uma louca querendo deixar tudo pronto o quanto antes.
É quase instintivo. No mais, organizar parece ser uma ótima coisa a se fazer quando aquela estranheza bate. Um vazio enorme toma conta do nada… É como quando alguém que você ama muito está próximo de fazer uma longa viagem e a sensação do abraço parece ser mais dolorida, mais profunda. É seu corpo abraçando quem está saindo de perto. Deve ser por isso também que, nesta fase, experienciamos uma sensação única de solidão. Uma solidão doída, sem remédio. Como se pela primeira vez na vida, só você pudesse traçar seu desfecho, mesmo tendo pessoas maravilhosas à sua volta, e, acredite, elas fazem grande diferença, mas são incapazes de preencher os vazios desta fase.
Por vezes, no meio da noite, você acorda encoberta de uma alegria louca, uma ansiedade do bem que avisa que você está prestes a conhecer o maior amor da sua vida. E não se preocupe se você ainda não consegue ter dimensão deste amor. Eu também ainda não consigo. Dizem que é mágico e que acontece na hora que o rebento nasce.
A espera, à espera
Desde a anunciação de que Caetano chegaria, me dediquei assiduamente à sua espera. Me preparei emocionalmente, estudei muito, li muitos livros, cultivei meu emprego legal e fiz uma playlist para o parto. Tudo isso para perceber que ainda não estava pronta.
Ter uma vida tão minúscula flutuando dentro de mim era algo que eu não estava preparada, obviamente. Saber o que era preciso para fornecer vida era algo que eu não estava pronta. Prematuramente, eu sobrevivi. Sem me dar conta da fraqueza inicial. 260 dias, e hoje eu só me vejo assim: tendo isso – vida para fornecer.
Como um prematuro que se apega ao calor sintético, ao oxigênio e a tudo o que é disponibilizado à ele para sobreviver, eu me apego a tudo para também estar pronta para trazer a vida.
Aos vinte e poucos, cheguei às 36 semanas, tenho um peso aceitável. Minha pele é firme o suficiente para aguentar o esticar de muitos centímetros. Sem ausência de vitaminas ou problemas pré-natais, e com músculos suficientes para segurar agora o peso de uma vida.
Eu estou pronta, para deixar tudo pronto, arrumar a casa, dentro e fora, deixar o quarto e meu regaço quentinho para abraçá-lo.
Nesta altura, percebo que o parto deve ser o mais próximo que experienciamos da morte, ou do renascimento, sem dúvida, é uma transição. Uma parte que parte das nossas entranhas para nos trazer, enfim, depois de tanta adolescência, de tanto despreparo, para a vida real.
Caetano Veloso resume:
Coisa linda
Minha humanidade cresce
Quando o mundo te oferece e enfim te dás, tens lugar
Promessa de felicidade, festa da vontade, nítido farol, sinal novo sob o sol, vida mais real
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