De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de divórcios no Brasil saltou de 130,5 mil para 341,1 mil, entre 2004 e 2014. Isso significa um aumento de 161,4% em dez anos. Os motivos que levam cada vez mais casais a optarem pelo divórcio, são muitos. Mas, neste contexto, existe uma constante: em casos de separação com filhos, o bem estar do pequeno deve estar entre as prioridades do casal, para que o rompimento dos pais não impacte no desenvolvimento da criança. No entanto, devido a diversas razões, alguns casais não conseguem resolver suas questões amigavelmente, podendo, inclusive, surtir efeitos contrários, prejudicando a rotina e a saúde da criança. É o caso da alienação parental.
A alienação parental ocorre quando uma das partes influencia o filho a tomar partido e a se colocar contra a outra parte. Aí, entra o papel do judiciário, que oferece meios de proteger os filhos, a partir de recursos legais, e, também o papel dos profissionais que podem ajudar pais e filhos neste momento, como o psicólogo. Para compreender melhor o que é a alienação parental, quais seus impactos na vida da criança e a melhor maneira de resolver a questão, nós conversamos com a advogada Amanda Piffer e com a psicóloga Sarah Helena.
O que configura a alienação parental?
Desde a aprovação da Lei 12.318, em 26 de agosto de 2010, foram definidos os aspectos e os meios de coibir a alienação parental. A advogada Amanda Piffer esclarece: “considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância, com o intuito de repudiar o genitor ou causar prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”.
Isso pode se dar de diferentes maneiras, como proibir que o pai/mãe veja a criança, fazer chantagens, manipular, influenciar a criança ou adolescente contra o pai/mãe, dificultar visitas, omitir informações sobre os filhos, apresentar falsas denúncias para dificultar a convivência, entre outras atitudes que prejudicam ou impedem a relação do filho com um dos genitores.
Quais as consequências da alienação parental para a criança ou adolescente?
Embora o final de um casamento seja um marco e tanto na vida do casal, as crianças são as que mais sentem com essa mudança. Sua rotina muda, e sentimentos como medo e insegurança podem aparecer em diferentes doses, dependendo da criança e, também, da forma como os pais vão lidar com a situação. Da mesma forma, “cada criança vai reagir de uma forma quando submetida à alienação parental”, afirma a psicóloga Sarah Helena.
No entanto, ela complementa: “segundo pesquisas voltadas para a Síndrome de Alienação Parental (SAP), as consequências da alienação parental para as crianças pode envolver, entre outros sintomas, culpa, ansiedade, depressão infantil, visão maniqueísta da vida, agressividade, medos, angústias, dificuldades de aprendizagem e somatizações. Estas consequências psicológicas e físicas acontecem, muitas vezes, junto a uma aversão ao pai/mãe alienado (bem como por tudo que é ligado a ele/a) desenvolvida pelo outro”.
Como e a quem buscar ajuda em caso de alienação parental?
Se você está passando por uma situação semelhante e já tentou várias alternativas, mas nada resolveu o problema, talvez seja o momento de pensar em buscar ajuda judicial, uma vez que a prática da alienação parental é prejudicial à formação psicológica e afetiva de crianças e adolescentes.
A advogada Amanda orienta: “Constatado ato de alienação parental, o indicado é que o genitor alienado procure o Conselho Tutelar do local em que reside, bem como a vara da infância e juventude, para buscar orientações acerca do caso concreto. Nada impede, no entanto, que se recorra, de antemão, ao Judiciário, uma vez ser-lhe assegurado o direito de ter o ato lesivo cessado.
Para tanto, basta que realize um requerimento (podendo ser de ofício também) em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidental. O processo terá tramitação prioritária e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso”.
Como a prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, o genitor alienante (aquele que pratica a alienação parental) deve ser responsabilizado. Por isso, a lei prevê punições para quem comete esta ou qualquer outra conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com o genitor.
Amanda afirma que, nesses casos, o juiz poderá, dependendo da gravidade da prática, “declarar ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; estipular multa ao alienador; determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente e declarar a suspensão da autoridade parental”. Além disso, a advogada ressalta que o alienante poderá ser processado penalmente pela prática do crime de denunciação caluniosa ou de comunicação falsa de delito ou de contravenção, de acordo com o caso específico.
Amanda ainda afirma que, com o objetivo de atuar contra a prática de alienação parental, “há um projeto de lei em tramitação (PL 4488/2016), que, se aprovado, tornará o ato de alienação parental crime passível de reclusão de três meses a três anos, com pontuais agravantes”.
A guarda compartilhada: uma possível solução
Em caso de separação com filhos, pensando no bem estar das crianças, a guarda mais recomendada é a guarda compartilhada. Vigente desde dezembro de 2014, por meio da Lei 13.058/2014, a guarda compartilhada possibilita a ambos os genitores maior proximidade e acesso à vida da criança ou adolescente, o que, segundo Amanda, “proporciona uma rotina semelhante à guarda conjunta e ao convívio e hábitos familiares que os filhos estão acostumados. Isso colabora para que os pequenos tenham o apoio necessário para superar as complicações que acompanham a separação, sobretudo no que diz respeito à ausência de amparo parental e consequente sensação de abandono afetivo”. Por esse motivo, essa é a guarda mais indicada para evitar a alienação parental.
No entanto, conforme afirma a advogada, é preciso prudência para que as diferenças entre o casal não interfiram na educação dos filhos. “É certo que, na guarda unilateral, a diminuição do convívio da criança com o genitor costuma ser gradativa, acarretando prejuízos ao desenvolvimento emocional infanto-juvenil, bem como facilitando a prática de atos de alienação parental. No entanto, a guarda compartilhada, se não exercida de modo democrático e recíproco, acaba por acarretar equânime situação, motivo pelo qual deverá ser precedida de cautela e equilíbrio”, ressalta Amanda.
Então, qual a melhor maneira de lidar com essa situação?
A realidade é que a separação envolve sofrimento, mudanças e muitos desafios. Por isso, é um momento de buscar manter a calma, procurar ajuda, se necessário, e, principalmente, apoiar e conversar muito com os pequenos, para que eles sofram o mínimo de impacto possível. Se você está nessa situação, cheio(a) de dúvidas e inseguranças, a psicóloga Sarah dá um conselho:
Quando os pais estão em processo de separação é muito importante que a situação seja colocada de forma clara e simples aos filhos, o que possibilita que eles lidem com seus sentimentos, tirem todas as dúvidas e diminuam as fantasias, que normalmente são piores do que a própria realidade. Muitas vezes a criança chega a pensar que ela é a causa da separação, o importante é privá-la desse pensamento e falar de forma aberta sobre o assunto.
Falar sobre a separação de forma neutra, sem prejudicar a imagem do outro, é importante para que os pequenos entendam que há uma grande diferença entre a relação amorosa dos pais e a relação entre mãe/pai-filhos, e que, mesmo que a primeira não tenha continuidade, o mesmo não se aplica à segunda, entre pais e filhos.
Proteger os filhos dos conflitos advindos da separação e não envolvê-los em disputas e desafetos é fundamental para a saúde psíquica deles. Neste momento de tantas mudanças para os pequenos, os adultos devem estar preparados para serem figuras de apoio, confiança e carinho.
Por isso, os pais devem buscar meios de se cuidarem e de se ouvirem, para estarem bem consigo mesmos e em suas relações com os filhos, lidando com sentimentos, se fortalecendo enquanto pais/cuidadores/homem/mulher.
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