Uma das principais características do ser humano é a ampla gama de emoções e sentimentos que somos capazes de ter. Afinal, o sentir faz parte da nossa condição.
Porém, as crianças com deficiência ou com algum transtorno do desenvolvimento enfrentam maior dificuldade em expressar e identificar seus sentimentos e emoções. De maneira geral, somos ensinados sobre as emoções de forma indireta, e as crianças típicas vão aprendendo por associação.
Então, como trabalhar os sentimentos de crianças com deficiência intelectual? 🤔
A inteligência emocional em crianças neurodivergentes precisa acontecer de forma mais clara, específica e com muita empatia. Neste artigo vamos entender melhor sobre como isso pode acontecer, vem com a gente!
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Por que as crianças atípicas têm dificuldades com os sentimentos?
Primeiramente, a capacidade de identificar e compreender os sentimentos por si só já é algo desafiador. Existem vários fatores que levam uma pessoa com deficiência a enfrentar maiores dificuldades, com o aprendizado de gestão da emoção.
Um deles está associado à compreensão da existência de forma geral. Muitas vezes, o sentimento de solidão e abandono podem ser experimentados quando a sua rede de apoio não está preparada para dar o suporte necessário as suas particularidades. A ausência afetiva, ou seja, sentir-se distante e não receber carinho e atenção das pessoas a seu redor também interfere nesse processo.
Outra questão que impacta significativamente a forma com que estas crianças lidam com seus sentimentos, é a angústia da liberdade. A medida em que elas vão adquirindo uma maior compreensão do seu entorno, começam a compreender que não desfrutam da mesma autonomia que seus pares. Com isso, podem sentir-se limitadas na sua possibilidade de fazer escolhas. É importante ter em mente que, embora muitas vezes não expressem, as crianças estão sentindo o tempo todo.
A dificuldade de comunicação das crianças atípicas, seja em decorrência de atrasos na fala, em fazer contato visual, desenvolver habilidades sociais, rigidez cognitiva ou qualquer outra barreira, não invalida a presença do sentimento, ou emoção, e pode se manifestar de formas diversas.
Elas também sentem!
Ainda que não consigam expressar de forma correta tudo que sentem e pensam, é importante sabermos que as crianças atípicas também têm um grande desejo de valorização emocional. Como qualquer pessoa, eles querem que suas emoções sejam valorizadas e reconhecidas. Por isso, é fundamental trabalharmos a inteligência emocional e sentimentos de crianças com deficiência intelectual.
A inteligência emocional é a capacidade de identificar e gerir as emoções, de ajustar comportamentos e melhorar as relações interpessoais. A boa notícia é que ela pode ser aprendida a qualquer tempo. Veja algumas formas de ajudar nossas crianças a desenvolver essa habilidade:
- Observação e nomeação: para criar o chamado vocabulário afetivo, é necessário olhar para os nossos próprios sentimentos e analisá-los. Incentive a criança a observar e nomear suas emoções e a dos outros. Você pode começar por personagens de um livro que a criança se interesse, desenhos ou histórias clássicas. Estabeleça paralelos sobre as ações das personagens e suas emoções. Por que ela fez isso? O que ela estava sentindo? Comece trabalhando com sentimentos básicos como alegria, tristeza, raiva e depois vá evoluindo para os mais complexos. Criar um vocabulário afetivo envolve paciência, compreensão e apoio contínuo para poderem expressar e compreender suas emoções de maneira mais eficaz.
- Regulação emocional: para ajudar a criança a fazer sozinha a sua regulação emocional, é importante antes de tudo ter uma boa conversa sobre as emoções positivas e as emoções negativas. Falar sobre a importância de entender de onde vem esse sentimento é uma maneira de começar a desenhar ferramentas para lidar com ele. Saber lidar com as decepções e frustrações é fundamental para que as crianças criem resiliência emocional. Validar e acolher os sentimentos de crianças com deficiência intelectual (na verdade, de qualquer criança!) é importante para fazê-la entender que suas emoções são genuínas.
Reconhecendo as emoções
Talvez você já saiba de tudo isso falado aqui em cima e esteja se perguntando de que forma é possível trabalhar essas habilidades na prática, uma vez que não recebemos este tipo de treinamento em qualquer instância da vida estudantil ou adulta. Por isso, vamos às ferramentas:
Crie uma rotina visual 🎭
Para começar a trabalhar as emoções básicas, você pode usar imagens da internet com expressões como feliz, triste, etc. (pesquise por máscaras faciais). Quanto menos detalhes a imagem possuir, melhor. Foque apenas nas expressões faciais. Escolha uma imagem para cada emoção. Num primeiro momento, mostre uma a uma para a criança e pergunte se ela sabe a qual sentimento aquela expressão está relacionada. Procure fazê-la lembrar de algum momento associado a determinada emoção. Você pode pendurar na parede do quarto ou mostrar regularmente para a criança as imagens e perguntar como ela está se sentindo.
Brinque de espelho de emoções 🪞
Com a ajuda de um espelho, incentive a criança a explorar as expressões faciais dos sentimentos que ela está conhecendo. Faça caretas para a criança também e pergunte o que ela observa na sua face. A sobrancelha mudou? E o formato da boca, como é?! O nariz fica diferente? E as bochechas? Quanto mais divertida e leve puder ser a brincadeira, maior o aprendizado.
Faça um calendário de emoções 🗓️
Este é um recurso usado até em empresas, o famoso: como estou me sentindo hoje?! Reservar um momento do dia para que a criança pense a respeito dos seus sentimentos e saiba escolher uma imagem que seja adequada ao seu sentimento pode ajudar a fortalecer esse entendimento. Você pode fazer uma variedade de rostos recortados que as crianças devem colocar em cima da data do calendário e que correspondam ao seu sentimento naquele momento.
Recursos valiosos
Como pai, mãe ou responsável de criança com deficiência, é importante que você conheça algumas ferramentas para lidar com os pequenos e pequenas.
A utilização da linguagem simples é uma delas. Crianças com deficiência podem apresentar maior dificuldade com a linguagem e o reconhecimento de um vocabulário muito sofisticado. Por isso, dê preferência a termos claros e simples.
Evite usar metáforas e expressões muito complexas. Frases curtas e na ordem direta também ajudam muito. “Isto daqui saiu de onde?” por exemplo, é uma ideia muito complexa. Prefira “Onde você achou isso?”.
Outro recurso é a modelagem. As crianças aprendem muito ao ver o que as outras pessoas fazem.
Por isso, deixe muito claro o que você está sentindo. Sorria quando estiver feliz, feche a expressão quando estiver triste, etc.
O reforço positivo é outra ferramenta poderosa. Lembre-se que longe de você é possível que a criança não se sinta tão à vontade e segura. Por isso, deixe sempre muito claro que ela está fazendo um bom trabalho quando identifica corretamente uma emoção ou sentimento.
É sempre bom lembrarmos que cada pessoa é única, assim como a forma com que ela lida com a sua deficiência. Por isso, precisamos sempre ter em mãos estratégias para lidar com as adversidades e evitar que momentos de crise aconteçam.
Estabeleça uma rotina. A previsibilidade é algo muito importante para pessoas com rigidez cognitiva. Saber o que vai acontecer no dia, no local ao qual está se destinando, ou mesmo, qual a rotina do passeio, faz com que elas se sintam mais seguras. “Agora vamos nos arrumar, entrar no carro e vamos ao shopping. Chegando lá nós vamos primeiro almoçar e depois vamos fazer o passeio, tudo bem?” – essa é uma maneira de trazer previsibilidade para a criança. Mas você também pode desenhar num papel ou fazer um calendário, dependendo da ideia que está tentando transmitir. Esse é um excelente método para lidar com a ansiedade nos pequenos.
Use experiências sensoriais. Objetos sensoriais e macios como almofadas e bichos de pelúcia, bolas anti-stress, pop-it, massinhas de modelar e outros objetos que ajudem a pessoa a se acalmar e focar em determinada atividade podem ajudar muito. Procure conversar anteriormente com a criança sobre quais objetos/brinquedos podem ajudá-la num momento de crise. Você pode criar uma caixa com esses objetos ou até mesmo criar um cantinho no quarto, ou na casa para essa situação.
Recursos para usar em qualquer lugar. Nem sempre quando a criança estiver em crise você terá recursos físicos à mão. Por isso, teste e guarde na mente algumas estratégias que pode usar em qualquer lugar, como: fazer uma respiração lenta e profunda, contar lentamente de 10 até 01, ou brincadeiras de memória, ou música que alegrem a criança e distraiam a mente com outras coisas.
Lembre-se sempre: conversar é o melhor caminho. Toda criança tem a necessidade de ser notada e validada, independentemente da sua condição psíquica e intelectual. Por isso é importante ter paciência e procurar experimentar diversas formas de abordagem, até que se encontre uma que seja mais eficiente com a criança em questão.
Do ponto de vista da Comunicação Não Violenta, a comunicação humana só acontece quando o indivíduo precisa expressar uma necessidade que não está sendo atendida. Quando não se tem a clareza deste mecanismo, a tendência é que expressemos nossos sentimentos de maneira equivocada. Trabalhar as emoções com as crianças e procurar entender o real motivo de cada sentimento demonstrado é uma jornada fascinante para desenvolvermos a nossa própria maturidade emocional.